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Iphan tem consulta pública para tornar as Tacacazeiras do Norte patrimônio cultural imaterial do país

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Iphan tem consulta pública para tornar as Tacacazeiras do Norte patrimônio cultural imaterial do país

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) promove, até o dia 19 deste mês, uma consulta pública para o reconhecimento do oficio de Tacacazeira da Região Norte como o mais novo item do Patrimônio Imaterial Nacional. Proposto pelo Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular (CNFCP/Iphan), o reconhecimento depende da aprovação e das contribuições dadas ao longo desta consulta pública.

Conforme a proposição, o oficio de Tacacazeira está espalhado por quase todos os Estados da Região Norte, com exceção de Tocantins. Em Belém e Rio Branco, por exemplo, o ofício já é considerado patrimônio imaterial dos povos destas cidade.

Conforme o CNFCP/IPhan, o ofício da tacacazeira é a prática secular produzir e vender o tacacá, uma iguaria amazônica feita com tucupi, goma de mandioca, camarão seco e jambu. Essa atividade, realizada principalmente por mulheres, é uma importante fonte de renda e tem raízes na culinária indígena, consolidado no final do século XIX e início do século XX, especialmente com a urbanização da Amazônia.

Historicamente a profissão era exercida por mulheres que sustentavam as famílias delas com a renda do tacacá, mas essa realidade mudou nos últimos anos com muitos homens aderindo a prática. A produção envolve o conhecimento sobre o preparo do tacacá, um prato que mistura influências culturais e é feito com ingredientes locais da mandioca.


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O tacacá de Manaus

A tacacazeira é uma figura comum e marcante nas ruas, calçadas e praças de cidades amazônicas como Manaus, onde o costume de tomar um tacacá do meio da tarde em diante é quase uma tradição entre os manauenses. Em eventos populares, empresariais ou familiares do ciclo de festas juninas o consumo da bebida também é bastante difundido.

O costume remonta a tempos ancestrais, com certeza, mas popularizou-se no século passado. No clássico “Introdução à Sociologia da Amazônia”, de 1956, o desembargador André Araújo registra o trabalho de tacacazeiras espalhadas pelos principais pontos de Manaus, como a Nega Vitória e a banca dela ao lado do Cine Odeon, na avenida Eduardo Ribeiro; Maria Portuguesa, em frente ao extinto cinema Guarany, onde hoje é uma agência bancaria na avenida Floriano Peixoto; e Preta Idalina, na frente do santuário de Nossa Senhora de Fátima, na Praça 14.

A banca mais famosa e longeva, contudo, certamente é a de dona Maria, também conhecida como Dona Branca, que trabalhou como tacacazeira por mais de 50 anos. Ela passou o bastão para a nora, hoje dona do Tacacá da Ivete (@tacacadaivete), na rua Ramos Ferreira, canto com a Tapajós, e em frente a Academia Amazonense de Letras.

Dona Ivete, tacacazeira
Dona Ivete, tacacazeira de Manaus

Do tempo em que todos os manauenses trabalhavam ou estudavam no Centro, em escolas como Benjamin Constant, Instituto de Educação do Amazonas (IEA) e Colégio Amazonense Dom Pedro II, o Estadual, todos acabavam indo tomar um tacacá ou na banca de dona Branca, hoje dona Ivete, ou na banca de Dona Hilda, na avenida Getúlio Vargas, ao lado do Hotel Plaza.

Dona Hilda, tacacazeira da Getúlio Vargas
Dona Hilda, tacacazeira da Getúlio Vargas

Com a valorização da gastronomia popular e as raízes do Amazonas, cantada nas toadas de Garantido e Caprichoso, as bancas se espalharam pela cidade e, como registrou o sociológo e professor da Universidade Federal do Amazonas Renan Freitas Pinto, chegou até nos shoppings, templos de consumo capitalista abrigando uma atividade ancestral da Amazôna.

Dona Adalgiza, tacacazeira da Praça da Polícia
Dona Adalgiza, tacacazeira da Praça da Polícia

Nessa expansão do consumo, hoje tem a banca da Ivete, no mesmo lugar onde a sogra fez fama, a banca da Gisela no largo de São Sebastião, a banca da Adalgiza, na praça da Polícia, as bancas da Tia Socorro, espalhadas por vários bairros da cidade.

Detalhe curioso é que migrantes e descendentes de migrantes acabaram se especializando na produção de boas cuias de tacacá. O mais famoso deles é o Tacacá do Ishiba, um legítimo nissei (filho de imigrante japonês), que funciona na praça de Alimentação do Eldorado, e o tacacá produzido pelo chefe José Blanco, um espanhol de Barcelona que imigrou para Manaus após ser criado na Venezuela. José Blanco é o chefe de uma das principais tacacarias existentes no largo de São Sebastião e garante ter dado um toque venezuelano a iguaria dos povos originários.